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Foto do escritorOrlando Coutinho

Cultura, o que se deve dizer.

Atualizado: 20 de jul. de 2019



O ensaísta e gestor cultural António Pinto Ribeiro (APR), escreve no Jornal Público de 01/09/15 uma reflexão pessoal intitulada << Políticas culturais: o que não se diz é mais importante do que os anúncios >> que merece algumas notas.

Extrapolando a nítida tendência preconceituosa que alguns agentes culturais têm de, olhar para a Cultura, como um património intelectual de esquerda – numa catalogação reducionista e atrofiada de pensar uma temática tão abrangente e crucial para o desenvolvimento humano – o autor não consegue, ainda que com esforço olímpico para tentar analisar em perspectiva, deixar de incorrer nessa mesma falácia. E feito este juízo de valor, em que não mais me deterei, sem prejuízo de contrapor algumas ideias, passarei mais à substancia do que foi dito.

O texto (embora não só) procura fazer uma análise aos programas políticos que os partidos concorrentes às legislativas de 2015 têm para o setor Cultura.

Num intróito subliminar, latejando em traços grossos as fronteiras de “esquerda e direita”no que à Cultura diz respeito, APR procura atirar à última uma sobrevalorização do património como ícone estrutural da sua política, como que este – que é apenas um – vector não se mesclasse na imagética nacional, ao que de imaterial e simbólico representa a identidade portuguesa. Esta errónea forma de pensar que a direita sobrevaloriza o património, esquece – porventura – que ele resulta na sua maioria do heroísmo transgeracional de um povo que, ante os seus feitos gloriosos, na afirmação da sua autonomia, da sua expansão global, na promoção dos seus valores e crenças, na construção social de urbes e em toda a dimensão humana, linguística e literária procurou a edificação do património, como marco simbólico da materialização estratégico – nacional que atravessou séculos. Temos vários exemplos dos mais simples, como o Padrão dos Descobrimentos que erigíamos à chegada dos “novos mundos” como marca de um Portugal Global; às Igrejas que deixamos por esse mundo fora e que traduziam uma crença maioritária do país; a edificação de cidades e pontos comerciais; a passagem da língua, enfim – de tudo um pouco polvilhamos várias geografias e também cá materializamos essa simbologia numa rede que hoje consideramos de monumentos nacionais que vai muito para além de um marco estilístico e são hoje, em muitos casos, “ponto de encontro” para a expressão artística mais variada e que vai desde a pintura, à escultura, à música entre outras.

O que disse no último período, não se confina ao que os antepassados nos deixaram. Está bem presente e vivo como marca cultural. E pego nisto para desmistificar outra falácia que APR incorre e que comummente se tenta perpassar: a direita no poder extingue os “Ministérios da Cultura” menorizando-a à categoria de Secretaria de Estado, como se daqui adviesse menos atenção à causa. Aqui é que o título de APR tem “mais encanto”. Senão vejamos: foi por mão de um Secretário de Estado da Cultura que se fez uma das mais emblemáticas obras do país – o Centro Cultural de Belém. Hoje aquele espaço, muito contestado à época, não é só – sendo-o também – património físico. As coleções e exposições permanentes e/ou temporárias; os encontros científicos ao género de Ágora, as artes e espetáculos em geral que por lá se fazem, constituem um valor seguro da mescla que falava entre o edificado e o imaterial. Aliás esse Secretário de Estado, bem quisto entre os “fazedores de cultura” durante o seu “pontificado”, foi em democracia – o “impulsionador mor” do conceito Cultura, seguindo-se-lhes “Ministros” que mais não foram do que subsequentes gestores de projetos como as Capitais Europeias da Cultura realizadas em Portugal, primeiro por aquele em Lisboa, corria o ano de 1994.

No propalado texto, APR, não se esquece de aconselhar a esquerda (muito para além da parlamentar) de como deve encarar a Cultura, “ajudando-os” a afinar o discurso à ínfima semântica de “povo”.

Volta-se uma vez mais à direita contra o papel que esta dá ao Mecenato no programa para a próxima legislatura. Talvez um pouco de memória, de encontro à Grécia antiga, ao Império Romano e até ao Renascimento, fizesse bem, para perceber o papel deste instrumento como baluarte real do que hoje podemos imaginar do conteúdo humano daquelas épocas e que, também agora – devemos usar para legar aos vindouros o que somos nós. Mas o Mecenato “privado” é “rasgo” de mente “ofensivo” ao exclusivo e desejável (?!) investimento público no setor… Pontos de vista!

Os recados a um “CDS nacionalista” até nem cabem, já que este deveria impor no programa uma atenção redobrada à internacionalização da língua assumindo o Português como património principal para a difusão cultural e identitária da pátria, algo que – na minha modesta opinião – está lá muito veladamente, exigindo-se mais.

Bem Vistas as Coisas, a Direita trata bem a Cultura, mas esta é um todo universal e humano que não deve confinar-se “(a)lados”!


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